O Ministério Público Federal (MPF) recomendou a suspensão e anulação de licenças para uma construção na área de Jacundá, no distrito de Alter do Chão, em Santarém, região oeste do estado. A recomendação foi direcionada ao secretário municipal de Meio Ambiente, João Antônio Paiva de Albuquerque, e ao prefeito Francisco Nélio Aguiar. O MPF também solicitou a demolição da edificação.
De acordo com o MPF, a construção foi realizada em uma Área de Preservação Permanente (APP), violando a legislação ambiental. A área, conhecida como Merakaiçara, é reivindicada pelos indígenas Borari como local de realização de rituais sagrados, pesca, extração de alimentos e remédios, e reuniões.
A recomendação inclui que os proprietários do terreno cessem quaisquer intervenções na APP e promovam a demolição e remoção da construção existente. Além disso, o MPF alertou para a obrigatoriedade de recuperação ambiental de toda a área afetada.
A investigação do MPF revelou que a Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Semma) de Santarém estava ciente da existência da APP em Alter do Chão, mas ignorou esse fato ao conceder as licenças para a construção. Segundo o procurador da República Vítor Vieira Alves, essas áreas desempenham funções ambientais e ecológicas importantes, como proteção contra erosão, filtragem de poluentes e manutenção de corredores ecológicos, especialmente em regiões de grandes rios como o Tapajós.
O parecer da Semma, que permitiu a emissão das licenças, indicou erroneamente que não haveria necessidade de desmatamento para a obra, alegando ausência de vegetação na área. No entanto, registros fotográficos e mapas por satélite demonstraram a presença significativa de mata na APP. Parte da construção também está situada na praia, considerada bem público de domínio da União e, portanto, área não edificável.
O MPF recomendou ao secretário municipal de Meio Ambiente e ao prefeito a realização de fiscalizações periódicas para impedir novas ocupações e crimes ambientais na região. Também solicitou a não emissão de novas licenças ambientais para as APPs de Alter do Chão, especialmente no Jacundá, e a consulta prévia e informada aos indígenas e comunidades tradicionais de Alter do Chão para áreas onde são permitidas licenças.
O MPF sugeriu ainda um mapeamento detalhado das áreas ilegalmente ocupadas ou construídas na APP de Alter do Chão, focando na região do Jacundá, e a implementação de um programa de educação ambiental em escolas e creches da região.
O MPF recomendou ainda que o prefeito e o secretário de Meio Ambiente encaminhem à instituição todos os processos administrativos ambientais de licenciamento da APP do Jacundá dos últimos quatro anos, incluindo cópias de licenças e pareceres técnicos, devidamente identificados em mapa.
Nota da Prefeitura de Santarém
A Prefeitura de Santarém, por meio da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Semma), informa que é importante frisar, que com relação ao tema, qual seja que o local em questão conhecido como Merakaiçara, sendo um local onde os Boraris realizam rituais sagrados, suas atividades tradicionais, pesca, reuniões e que a área serve para a retirada de remédios nativos e fonte de extração de frutas, a Semma esclarece que a falta de identificação e oficialização de territórios indígenas precariza a questão dos empreendimentos em Alter do Chão, que oficialmente é um Distrito do município de Santarém, pertencente a sua gleba patrimonial.
Caso Alter do Chão seja de fato e de direito considerado um território indígena oficializado/demarcado, o município e o estado do Pará seriam incompetentes em matéria de licenciamento ambiental, conforme o artigo 7°, inciso XIV, alínea c, da Lei n º 140/2011 , o que causaria uma insegurança jurídica a respeito dos serviços públicos ofertados no referido distrito, bem como a regularização dos empreendimentos ali presentes, sejam mercearias, pousadas, restaurantes, hotéis, entre outros, propiciando a realização de um licenciamento mais burocrático através dos órgãos federais.
Podemos observar que segundo os dados extraídos da Fundação Nacional dos Povos Indígenas, a etapa de reconhecimento do povo indígena Borari se encontra em estudo (PORTARIA Nº 776, DE 4 DE JULHO DE 2008), portanto, não há delimitação de área.
Quanto aos demais argumentos levantados pelo Ministério Público Federal, qual seja o desmatamento em Área de Preservação Permanente (APP), eles serão debatidos no bojo do Procedimento Preparatório para dirimir dúvidas do MPF quanto a regularidade e legalidade da tramitação do licenciamento ambiental.