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Anna Karoline III

MPF denuncia seis pessoas por homicídio culposo e atentado contra a segurança do transporte fluvial

O órgão também pede à Justiça indenização às famílias dos 42 mortos e 51 sobreviventes, e ressarcimento de R$ 2,9 milhões aos cofres públicos.


Foto: Divulgação/Governo do Amapá

O Ministério Público Federal (MPF) denunciou seis pessoas por homicídio culposo e atentado contra a segurança da navegação no naufrágio do navio Anna Karoline III, que deixou 42 mortos, em fevereiro de 2020. As investigações concluíram que o dono do navio, dois comandantes – o do Anna Karoline III e o de uma outra embarcação –, dois militares da Marinha e um despachante são responsáveis pela tragédia. A ação, ajuizada na segunda-feira (7), visa responsabilizar os envolvidos, pretende a reparação às vítimas, com indenizações de R$ 50 mil a R$ 200 mil por pessoa, e o ressarcimento de R$ 2,9 milhões aos cofres públicos.

Inicialmente, as investigações foram conduzidas pela Polícia Civil do Amapá. Após, pela competência federal para apurar o caso, a Polícia Federal assumiu as investigações, tendo concluído o inquérito no final de maio deste ano. O trabalho apontou que a causa determinante do naufrágio do Anna Karoline III foi a perda de estabilidade em decorrência do excesso e da má distribuição de carga a bordo. Dados da Capitania dos Portos do Amapá indicam que o navio possuía capacidade máxima de carga de 95 toneladas. No dia do sinistro, porém, foram embarcadas aproximadamente 173 toneladas de carga.

Foto: Reprodução

Laudos periciais indicaram que o navio, construído em 1955, também apresentava falhas estruturais de segurança por falta de manutenção. O disco de Plimsoll – marca no costado da embarcação, em ambos os bordos, que indica o limite até o qual o navio pode ser carregado com segurança – foi adulterado. A adulteração deslocou a marca a quase quatro metros à frente, criando ao observador externo a falsa impressão de segurança quanto à capacidade de carga. O ilícito é imputado ao dono da embarcação e ao comandante, a quem o navio era indevidamente locado. Consultada, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) informou que, além de a embarcação não poder ser sublocada pelo dono a terceiros, operava o trecho entre Santana (AP) e Santarém (PA) sem autorização da autarquia.

Durante a fiscalização da Capitania dos Portos em Santana, que durou cerca de 5 minutos e também foi falha, o excesso de carga foi omitido. Os documentos apresentados pelo comandante e pelo despachante aos fiscais continham informações falsas a respeito do quantitativo de carga e de passageiros do navio, indicando números muito inferiores aos efetivamente existentes na embarcação. Diferentemente do informado à autoridade marítima, não havia apenas 29, mas pelo menos 93 pessoas a bordo.

A viagem, que partiu do Porto do Grego, em Santana (AP), por volta das 18h, percorreria 300 milhas náuticas até Santarém (PA). Ao alcançar 80 milhas, navegando pelo Rio Amazonas, entre 4h e 5h da madrugada, o comandante realizou manobra irregular para reabastecer clandestinamente o navio. Uma outra embarcação, denominada Albatroz, foi atracada na lateral do navio para efetuar o reabastecimento com óleo diesel. Durante a operação, a embarcação deu os primeiros sinais de adernamento. Em poucos minutos, o navio Anna Karoline III naufragou. No momento, chovia e ventava, e muitos passageiros ainda dormiam, dificultando a fuga da tragédia. Das 93 pessoas que estariam a bordo, 42 foram a óbito – duas crianças, dadas como mortas, seguem desaparecidas – e 51 foram resgatadas com vida.

Foto: Divulgação/Governo do Amapá

Indenização

O MPF pede à Justiça que fixe indenização mínima aos sobreviventes, de R$50 mil por pessoa, excluindo do cálculo o comandante da embarcação, também listado como sobrevivente nas listas oficiais. Às famílias das vítimas que perderam a vida, é pedida indenização de R$ 200 mil por pessoa. Também deve ser ressarcido aos cofres públicos o valor da operação de resgate de vítimas e reflutuação do navio.

Embora a obrigação legal de retirar a embarcação do fundo do rio fosse do proprietário, o Governo do Amapá – dado o estado de calamidade e a necessidade de resgate dos corpos – contratou empresa especializada no serviço por R$ 2, 4 milhões e teve custos extras de aproximadamente R$600 mil. Somados, os valores da indenização e do ressarcimento dos danos aos cofres públicos chegam a R$ 13, 8 milhões. O valor deverá ser pago pelos denunciados, em caso de condenação.

Penas

·         Os militares da Capitania dos Portos do Amapá, que são os responsáveis pela fiscalização, deverão responder também pelo crime de prevaricação, que prevê pena de detenção de 3 meses a um 1 ano e multa;

·         Falsificação de documento particular, devem responder o despachante e o comandante do navio que podem ser condenados à pena de reclusão de 1 a 3 anos e multa;

·         Pelo comércio e abastecimento irregular de óleo diesel na embarcação, os comandantes do navio Anna Karoline III e do Albatroz que podem responder por crime contra ordem econômica, cuja pena de detenção é de 1 a 5 anos;

·         Para o crime de atentado contra a segurança de transporte fluvial, do qual resulta naufrágio, a pena é de 4 a 12 anos;

·         Por se tratar de crime de perigo doloso o qual resultou morte, a pena privativa de liberdade pode ser aplicada em dobro;

·         E pelo crime de homicídio culposo, a pena varia de 1 a 3 anos de detenção e pode ser multiplicada pelas 42 mortes registradas.

Denunciados

·         Erlon Pereira Rocha – dono do navio Anna Karoline III

·         Paulo Márcio Simões Queiroz – comandante do navio Anna Karoline III

·         José Maria Oliveira e Sena – despachante

·         Manoel do Carmo Oliveira dos Reis – comandante do navio Albatroz

·         Wesley Hilton de Souza Frias – militar da Marinha do Brasil

·         Valdinê Pereira da Silva – militar da Marinha do Brasil

A empresa Erlonav, de propriedade de Erlon Rocha, informou que "não emitirá nenhuma nota, por se tratar de processo judicial".

O acidente:

O acidente aconteceu em 29 de fevereiro de 2020, em um trecho do Rio Amazonas, no sul do Estado do Amapá. A embarcação seguida de Santana, no Amapá para Santarém, no Pará, rota considerada clandestina porque a empresa não tinha autorização para fazer a viagem. Das mais de 90 pessoas que viajavam, 42 morreram. Duas crianças estão desaparecidas.

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